domingo, 27 de setembro de 2020

DA IDADE DO UNIVERSO, DA TERRA, DOS ANIMAIS, DO HOMEM

 Carlos Nougué

1) A questão da idade do universo é de livre disputa 

a) Argumento de fé. A Comissão Bíblica sob S. Pio X, e com seu endosso, respondeu a esta questão: “Se na denominação e distinção dos seis dias dos quais fala o capítulo 1 do Gênesis se pode tomar o ‘dia’ ou em sentido próprio, como um dia natural, ou em sentido impróprio, como um espaço indeterminado de tempo, e se é lícito discutir livremente sobre essa questão entre os exegetas”, com um “Sim”.

b) Argumento de matéria física conexa com a fé. Na Alocução Un Ora Sobre as Provas da Existência de Deus à Luz da Ciência Natural Moderna, pronunciada numa audiência solene à Academia Pontifícia de Ciências, Pio XII assume a teoria do big bang como a mais provável; mas aceitá-la implica aceitar que a idade do universo seja de bilhões de anos.

c) Meu argumento. De fato, a teoria do big bang parece ser verdadeiramente, hoje, a mais provável quanto ao modo como o universo veio ao tempo, o que implica a aceitação de que tenha sido criado há bilhões de anos. Mas o universo é uma imago Dei, uma imagem de Deus, e, para representar a eternidade divina, parece mais conveniente que o universo tenha tão longa idade do que se tivesse uma curta idade – assim como o fato de que o universo seja imenso é mais conveniente para representar a infinitude de Deus do que se ele fosse menor. 

Objeção. Definiu o Concílio Lateranense IV: “Deus... Criador de todas as coisas visíveis e invisíveis, das espirituais e das corporais, por seu próprio poder onipotente no princípio do tempo criou ao mesmo tempo e desde o princípio todas as criaturas do nada, espirituais e corporais, a saber, anjos e criaturas materiais, e por último o homem, constituído, por assim dizer, tanto de espírito como de corpo”. Logo, parece que os argumentos acima não se seguem.

Solução. Note-se a aparente imprecisão da formulação: criou tudo ao mesmo tempo, mas o homem por último. Logo, “ao mesmo tempo” não quer dizer aqui “simultaneamente” no tempo, mas sim “(criar) da eternidade (que é simultânea)”; o que se reforça pela expressão “desde o princípio”. É que não temos termos para expressar perfeitamente a criação ex nihilo. – Ademais, cada alma humana é criada e infundida junto com cada união prolífica de dois gametas paternos. Assim, Deus não criou ao mesmo tempo todas as almas humanas. – Por fim, terão São Pio X e Pio XII incorrido em desvio da fé? Deve intervir aqui a chamada analogia da fé, segundo a qual o menos claro há de entender-se segundo o mais claro.

2) A questão da idade da terra 

Meu argumento. Por todo o dito quanto à questão anterior, não parece inconveniente que a terra tenha milhões ou bilhões de anos, como, aliás, por diversos indícios, parece ter efetivamente. 

3) A questão da idade dos animais 

Meu argumento. Parece difícil que os animais estejam na terra há muito mais tempo que o homem. Com efeito, vemos correntemente espécies animais extinguir-se (como aliás se extinguiram os dinossauros) ou estar à beira da extinção. Ora, se os animais vivessem aqui há demasiado tempo, é provável que já não existisse a maioria das espécies, ao menos as terrestres. 

4) A questão da idade do homem 

a) Argumento de fé. Embora o magistério nunca se tenha pronunciado formalmente sobre a idade do homem, as Escrituras indicam que está na terra há cerca de sete mil anos.

b) Argumento de razão do Padre Álvaro Calderón (com o qual concordo plenamente). Se existindo há cerca de sete mil anos o homem já fez tudo quanto fez e já ocupou quase toda a terra, imagine-se o que se teria se existisse há, por exemplo, vinte mil anos (para não falar do que se teria se existisse há centenas de milhares de anos...). 

Observação. Os métodos radiométricos de datação são todos de algum modo falhos, como mostrarei num apêndice a meu livro Comentário ao Apocalipse. O menos falho é o de datação por carbono-14. Mas este só tem mais precisão até seis mil anos...