quinta-feira, 12 de março de 2020

ADEUS A UMA ILUSÃO – MEU ROMPIMENTO FORMAL COM O CENTRO DOM BOSCO E COM A LIGA CRISTO REI


Carlos Nougué

Nota prévia 1. Peço-lhes desde já imenso perdão pela extensão e pela aridez das linhas que se seguirão. Como porém todo o caso que culmina na decisão minha que se lê no título deste texto envolve muita desinformação, duplicidade e inverdade, e como nos últimos três anos minha atividade católica pública esteve muito identificada com o CDB e com a LCR, vejo-me obrigado a escrevê-las assim. Mas tentarei que seja minha última palavra sobre o assunto. Quero virar esta página definitivamente, e só voltarei ao tema se se disserem falsidades graves acerca de mim. Não se pense que me tenho em alta conta; meu ofício não é ter razão, e sou um pecador como outro qualquer. Mas tenho coisas que defender: um magistério tomista, uma produção livresca filosófica, e antes de tudo uma família, onde meu filho de 15 anos jamais verá seu pai encolher-se como uma donzela diante de nenhuma cara feia – nem, muito menos, de hereges.
Nota prévia 2. O que relatarei aqui tem muita semelhança com algo que vivi entre 2009 e 2011. Não vou tocar este caso neste texto, e não o farei nunca se deixarem de aguilhoar-me com indiretas. Se todavia continuarem a fazê-lo, ver-se-á perfilar por minhas palavras uma figura horrenda, mesclada de inveja, de traição e de covardia.

1) Converti-me aos 49 anos (tenho hoje 68) após uma vida de ateísmo e de revolução; e converti-me já em ambiente tradicionalista. A partir de certa altura, ademais, passei a fazer parte do movimento tradicionalista conhecido por Resistência.
2) Há cerca de três anos e meio, no entanto (e perdoem-me qualquer imprecisão cronológica), conheci o CDB e afastei-me da Resistência (sem animosidade, creio) porque ela não via nos rapazes do CDB o que eu julgava ver: no bojo da crise deflagrada na Igreja pelo pontificado de Francisco, a evolução desses rapazes para a doutrina da realeza de Cristo e para um conhecimento cada vez maior das raízes dessa mesma crise. De início, é verdade, deparei com um clima muito influído pelo olavismo, além, é claro, de uma mistura indigesta de correntes católicas não raro antagônicas. Mas como não ter esperanças, se, semanas depois de uma queda de braços com um jovem astrólogo (por sinal, um jovem de ouro), veio agradecer-me ele: tinha até confessado a um padre o pecado da astrologia? Como não tê-la, se se formava a Liga Cristo Rei, se se começava a defender aí o estado católico, se me deixavam campo aberto para tratar a crise da Igreja, se progressivamente mais e mais jovens aderiam ao rito tridentino, etc.? Nunca, em nenhum momento, nem nas aulas no CDB nem nas palestras dos fóruns da LCR, eu deixei jamais de expor a mesma doutrina que sempre expus desde minha conversão. – Além disso, afeiçoei-me a alguns rapazes como a filhos, além de que, já gravemente doente há três anos e meio, sempre recebi generosa e caridosa ajuda deles e do CDB em geral (por exemplo, o CDB arcou com todas as despesas do funeral de minha irmã, após o qual eu teria a primeira de cinco internações no ano passado). A gratidão que lhes tenho irá comigo após a morte como vincos na alma.
3) Mas eis que há uns dois anos minha esperança cambaleou pela primeira vez. Um dos principais dirigentes do CDB me escreveu um dia: “Professor, acho que devemos parar de falar um pouco do estado cristão. O Olavo vai reagir, etc., etc.” Eu, na hora, meio atordoado, disse que sim. Mas exatamente na manhã seguinte lhe escrevi: “Se quiserem vocês parar de falar do estado cristão, façam-no. Eu continuarei a fazê-lo, e que me ataque Olavo”. – Foi por então que percebi a grande influência que Antônio Donato, o responsável pelo grupo Anistia (que coordena, ao que parece, a resistência nacional ao aborto, etc.), exercia sobre alguns dos principais membros do CDB. Ora, já escrevi no FB que por seu livro A Educação segundo a Filosofia Perene não se pode ver em Donato um gnóstico ou perenialista; mas deve ver-se, sim, um modernista conservador, o que se pode provar sobretudo pelo capítulo de seu livro atinente à política: puro Jacques Maritain, o corruptor do tomismo no século XX. Como quer que seja, contudo, é inegável que do Anistia fazem parte muitos e não desprezíveis olavetes, e que a postura geral do Anistia com respeito a Olavo de Carvalho e sua seita é pelo menos de cordialidade. As coisas começavam a juntar-se em minha mente, e não faltava confirmação por parte de algumas pessoas. Como porém algum tempo depois o CDB voltou a falar em estado cristão, minha beata e beócia ingenuidade fez-me cegar outra vez.
4) Mergulhei mais e mais no CDB e na LCR, que passaram a ser o centro de minha vida católica pública. Sucede no entanto que no primeiro semestre do ano passado me chegou ao conhecimento que o ministro Ernesto Araújo, gnóstico perenialista assumido, palestraria no III Fórum da LCR. Opus-me (com outros), mas a resposta da parte do CDB era sempre a mesma: Nossos mestres (Antônio Donato, Leonardo Penitente, Dom Justino...), além de personalidades como o Dr. Ricardo Dip e Miguel Ayuso, não veem óbice nenhum na participação do ministro. Disse então ao CDB que não palestraria eu no Fórum. Após porém muitos e-mails, telefonemas e reuniões, acabei por ceder, até porque se me fez a promessa de que eu poderia palestrar imediatamente após o ministro e dizer, pois, o que eu quisesse acerca do perenialismo, etc. Quis a fortuna que o ministro não pudesse comparecer ao encontro.
5) No III Fórum da Liga Cristo Rei, minha ingenuidade beata e beócia cegou-me ainda mais. Realmente, afigurava-se-me que a Liga como um todo progredia firmemente para posições católicas tradicionais e consequentes. Lembre-se, aliás, que pouco antes do Fórum pude gravar para o CDB a primeira aula da série “Raízes da Crise na Santa Igreja”, na qual resumi a doutrina de meu livro Do Papa Herético (cf. https://www.youtube.com/watch?v=M1fGx3uJhfw&t=202s). – Quanto a OdC, desde 2011, depois de desafiá-lo a um debate para desagravar a honra de um amigo (desafio de que ele correu em meio a mentiras e xingamentos), eu houvera por bem criticar sempre suas heresias gnóstico-modernistas sem todavia citá-lo nominalmente (estando sempre preparado, no entanto, para o confronto público se ele me atacasse nominalmente), e acreditei ver no CDB a mesma política. Eis no entanto que há poucos meses descobri, tristemente, que não era esta a política do CDB, mas a de não entrar nunca em confronto com OdC. Em verdade, descobri que eu não era mais que uma fachada tradicionalista para o CDB e a LCR, capaz de atrair muita gente, desde porém que não se tocasse o ninho de vespas das relações cordiais entre CDB-LCR, Anistia e OdC.
6) Para que se veja a justeza do que digo, sou forçado a dar a cronologia dos eventos que me fizeram cair enfim as escamas dos olhos.
a) Há uns meses, o Padre Sérgio Muniz e dois importantes dirigentes do CDB começaram a criticar Italo Marsili pelo tratamento prostibular que aplicara a um suposto paciente seu pedófilo. Nunca entendi muito bem por que os três passaram a criticá-lo publicamente e tão duramente, porque, pensava, OdC muito provavelmente reagirá em defesa de Italo. Continuo sem entendê-lo.
b) A reação do sofista psiquiátrico foi dura, bem ao estilo da seita olavética, e vi os três que haviam começado a criticá-lo esmorecer. Era uma humilhação. Entrei na briga com Italo para defender os três e o CDB. Travou-se então este diálogo escrito entre um desses dois dirigentes do CDB e mim:
Eu: “Mas exatamente por isto é que tomei a frente da coisa: para aliviar o CDB. Fique tranquilo. Sou casca-grossa, velho comuna... Um abraço grato e saudoso”.
Ele: “kkkk. o sr estará em nossa história, mestre”.
Pouco depois, o outro dirigente do CDB escreveu num comentário de meu perfil do FB: “O senhor está nos mostrando o que é a verdadeira testosterona (a católica)”.
c) Mas eis que uns seguidores de Italo e de OdC começaram a detratar-me, pasmem! pelo fato de eu ter cuidado durante um ano de uma cadela de OdC!... (Eu fora editor de OdC durante dois anos antes de minha conversão.) Não me fiz rogar: escrevi um post no FB chamando-os “um imbecil coletivo”. – Hoje, os dirigentes do CDB dizem que com este post fui eu quem começou a briga com OdC; que o provoquei eu. Certamente quereriam que eu pusesse o rabo entre as pernas como eles têm feito diante de fundas humilhações públicas que OdC, Italo Marsili, Silvio Grimaldo, Mauro Ventura et caterva lhes vêm infligindo (não as mostro aqui; mas, se o negarem, fá-lo-ei em outra publicação). Ademais, ainda que tenha sido esta a razão do que se verá a seguir, que erro ou pecado há em criticar um herege e gnóstico? Ou talvez o haja, segundo as cordiais relações entre CDB-LCR, Anistia e OdC...
d) Como era de esperar, OdC passou a atacar-me – e eu a reagir. Não me é preciso recapitular os muitos passos desta contenda. Mas devo mostrar, ainda, os dois últimos diálogos entre mim e o mesmo dirigente do CDB que dissera que eu entraria para a história deste. O primeiro:
Ele: “Mestre. Avalia se é necessário estender essa briga [com OdC]. Pense mais um pouco”.
Eu: “É guerra, meu amigo, sem passo atrás. Não sou cão para pôr o rabo entre as pernas. Ele é que começou. Agora vou com tudo. E quem quiser apoiar-me que o faça. Quem não quiser que não o faça. Já me acostumei com os XXXs da vida. Acho que vou mostrar a meu filho um ato de covardia? Quer que ele veja seu pai enxovalhado sem reagir? Por favor, XXX. Repense-o você”.
[Note-se que eu não disse que o CDB e a Liga não precisavam apoiar-me, como querem seus dirigentes vender agora ao público. Acho que aprenderam bem de OdC o uso da estimulação contraditória.]
Ele: “Está bem. Desculpa”.
O segundo diálogo deu-se depois de o mesmo dirigente do CDB, justamente um dos que começara a guerra com Italo, ter dito que a guerra que então se travava era um show de vaidades. Perguntei-lhe:
“Você me inclui no show de vaidades?”
Respondeu-me:
“Eu não acompanhei seus posts. [...] Eu caí diversas vezes em vaidade. Não quero pagar esse preço no tribunal divino”.
Quem sabe um dia Deus me dará a graça de entender isto? Enquanto isso, porém, prossigamos.
e) Depois, passei a sofrer ataques de dupla frente: OdC e seus sequazes, por um lado, e CDB-LCR, por outro. Para a maioria dos dirigentes destes, o que eu estava fazendo, ao enfrentar o herege OdC, era imprudente! “Primeiro precisamos ser fortes para depois enfrentá-lo”, diziam e dizem; é como se os primeiros cristãos dissessem: “Primeiro precisamos ser fortes para depois enfrentar os judeus”. Creio que Santo Estêvão não o aprovaria. Mas o pior ainda estava por vir: alguns dirigentes do CDB-LCR passaram a dizer que não estavam preparados ainda para o confronto, e que seria preciso primeiro estudar bem o perenialismo para enfim lançar-se a criticar OdC. Haja sofisma, ou melhor, haja covardia travestida de sofisma! Se alguém, como OdC, diz – como de fato o faz – que a religião é um “conto de fadas”, de que precisa mais um católico para afastar-se dele? Se esse mesmo OdC diz – como de fato o faz – que Cristo não veio trazer-nos nenhuma doutrina (nem moral!), de que precisa mais um católico para denunciá-lo? Nem de meditação, nem de estudo, nem de conselho. Mas parece que pelas veias de muitos líderes católicos atuais corre sangue de barata.
f) Estou para terminar este texto, tão aborrecido para mim como certamente para todos. Mas antes preciso ainda tecer algumas considerações.
a) Não vou parar a luta contra OdC e sua seita gnóstica disfarçada de católica. Mas o vou fazer sobretudo em livros, etc. Quero vê-los refutar-me. Vou sair do terreno deles, ou seja, o das futricas de FB, e forçá-los a lutar em terreno onde são de todo ineptos: o da fé, o da doutrina, o da verdadeira filosofia. Chutar comunista morto é fácil. Venham arrostar-me a mim.  
b) Rompo formalmente toda e qualquer relação, incluindo a editorial, com o CDB-LCR. Isto me afetará financeiramente; perco público comprador de livros. Mas não vou agir como eles, que, como me disse alguém indignado, agem assim “porque não querem perder os contatos” – o grand monde do conservadorismo donatista-olavético. – Como porém não sou sectário, sempre que o CDB e a LCR fizerem algo de efetivamente bom pelo catolicismo, ou lançarem um livro de real importância, divulgá-lo-ei sem nenhuma hesitação.
c) Por fim, acusei-me mais acima duas vezes de “ingenuidade beata e beócia”. Mas devo ser tão duro comigo? Em parte sim, mas em parte não: porque a Liga Cristo Rei não é composta somente de timoratos. É com um coração vibrante que vejo quatro centros da LCR enfrentar virilmente, com toda a hombridade, não só a seita nefasta de OdC, mas os restantes centros da mesma Liga. São eles: o Centro São Pedro de Verona (Maceió), o Instituto Leão Magno (São Paulo), o Instituto Jackson de Figueiredo (Aracaju) e o Centro Cultural Ávila (Belém). Que prossigam, ainda que minoritariamente.
d) Mas não os lidero, nem os vou liderar, apesar das falsas acusações de que são dirigidos por mim (é que quem só sabe viver sob o tacão de um guru não consegue imaginar outra coisa). Meu ato de rompimento é solitário. Já vai longe o tempo de minha estada nesta terra. Peço a Deus que me deixe completar a educação de meu filho, a gravação das 250 aulas da Escola Tomista, e os muitos livros que estou escrevendo (alguns com atraso por causa de meu péssimo estado de saúde, pelo que, aliás, peço outra vez desculpas). Mas o fato é que vivo hoje numa bolha; já nem posso sair de casa; e não é difícil de imaginar que me encontro em constante preparação para a morte. Não posso pois dar-me agora ao luxo de fazer o que nunca quis: liderar nada. Os referidos quatro centros têm todo o meu apoio; mas deles não espero senão que continuem viris.
Que tudo seja para maior glória de Deus – e viva Cristo Rei!  

   P.S.: Não poderia deixar de agradecer aqui, penhoradamente, o apoio que sempre me prestou a Sociedade da Santíssima Virgem Maria, de Montes Claros (MG); e, para fazê-lo, nada melhor que repetir uma vez mais seu brado: Maria sempre!