quinta-feira, 4 de fevereiro de 2021

OUTRA QUESTÃO METAFÍSICA: QUEM LEVA A ATO SEGUNDO AS POTÊNCIAS ATIVAS DAS CRIATURAS?

                                                                                                                        Carlos Nougué

 Quando mo permitiam as injeções, etc., também minha última internação me foi muito proveitosa intelectualmente. Com efeito, consegui estruturar então, no leito hospitalar, outra das já muitas questões de meu futuro livro “Questões Metafísicas”. Ei-la, em suma:  

Os antigos diziam que Deus move a primeira esfera celeste, e que esta move a seguinte esfera, e assim sucessivamente, esferas que, em seu movimento conjunto, são de algum modo causas das formas e motores das próprias potências ativas no mundo sublunar. Mas isso já não se pode sustentar. Assim, por exemplo, Deus é não só o criador direto das almas humanas, mas é quem move suas mesmas potências ativas a atuar. Com efeito, a vontade pode fazer voluntária a inteligência, mas não pode levar esta potência a inteligir, porque para tal falta comproporcionalidade entre causa e efeito. E isto vale também para a potência ativa do intelecto agente. A potência ativa do intelecto agente é real e individual, e de fato é ela quem leva ou reduz a ato o intelecto possível (potência passiva). Mas é Deus quem move o intelecto agente a agir; feito isto, o próprio intelecto agente abstrai dos fantasmas as espécies inteligíveis e com elas reduz a ato o intelecto possível. Em outras palavras, Deus é não só o criador direto da alma, mas move suas potências ativas a atuar por conta própria – o que lança a última pá de cal sobre o deísmo racionalista, segundo o qual Deus criou o universo e a partir do sétimo descansou para sempre, entregando o mundo à própria sorte de sua natureza. Não: Deus não só traz o universo e seus entes a ser, senão que os sustenta nele ao mesmo tempo que sustenta sua ação atuando suas potências ativas. Em resumo, Deus é não só o primeiro motor imóvel das séries de motores, mas o motor imóvel e permanente de todos e cada um dos motores, sempre que se trate de fazê-los mover-se a seu ato segundo (a inteligência a inteligir, a vontade a querer, a vis irascível a irar-se, o gravitacional-inercial a fazer girar os corpos celestes, etc.). Deus é motor de motores, eficiente de eficientes, ente de entes, perfeição de perfeições, finalidade de finalidades. Como diz o P. Santiago Ramírez O.P. em De actibus humanis, trata-se da moção que propriamente se pode chamar “divino instinto”.